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Medwave 2011 May;11(05):e5040 doi: 10.5867/medwave.2011.05.5040
Os enfermeiros e o doente com doença mentalNursing and mental healthCarolina Henriques, Nelson Simões de Oliveira ResumenO presente estudo visa conhecer e descrever as vivências dos enfermeiros de cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental, tendo como questão de investigação “Quais as vivências do enfermeiro nos cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental?”. Constituindo-se um estudo de natureza qualitativa de enfoque fenomenológico, no domínio da investigação-acção, procurou-se ‘entrar’ no mundo das vivências dos enfermeiros, através do recurso a entrevistas semi-estruturadas, desenvolvendo-se a investigação em dois momentos distintos. Fizeram parte deste estudo três enfermeiros da Unidade de Saúde Familiar de Marmelais, que para além de terem participado nesta investigação, foram alvo de um processo de intervenção onde se desenvolveram múltiplas acções, que passaram por processos formativos na área da saúde mental, e realização da parametrização sob a forma de norma de orientação clínica (NOC) da consulta de enfermagem. Num primeiro momento os enfermeiros revelam uma construção estigmatizante da patologia mental, observando-se juízos de valor e ideias pré concebidas na prestação de cuidados. Assiste-se ainda a um sentimento de insegurança, défice de intervenção sentida pelos próprios enfermeiros que revelam “sentir” o seu exercício como ineficaz e pouco profundo no domínio da saúde mental e psiquiatria. Num segundo momento, após intervenção, observa-se sentimentos de maior segurança e procura de práticas mais profundas e estruturadas nos cuidados de enfermagem prestados por estes enfermeiros perante o adulto com doença mental, revela-se ainda o uso de instrumentos facultados nas consultas de enfermagem e normas de orientação clínica. Constatamos assim a mudança do estado do fenómeno do primeiro para o segundo momento, ressaltando a necessidade de apoio, formação e supervisão por parte dos enfermeiros especialistas em saúde mental dirigida aos enfermeiros generalistas de cuidados de saúde primários. IntroducciónPor entender-mos que os cuidados ao utente com patologia mental está presente em todas as fases de vida, bem como em diferentes patologias de carácter físico e curativo, na prestação de cuidados do enfermeiro, independente da sua área de exercício, considera-mos, e de acordo com Silva (2003), que os cuidados de saúde primários são locais apropriados, se munidos de recursos capazes para actuar adequadamente, numa detecção precoce e acção preventiva aos transtornos mentais. Para tal, é fundamental que os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros de cuidados de saúde primários sejam capazes de ir ao encontro da doença e do doente mental. MétodosPretendendo o entendimento do fenómeno em questão, não se absorvendo com explicações e generalizações, pensamos que a metodologia qualitativa de enfoque fenomenológico seja aquela que mais se adequa à nossa problemática. Spiegelberg (1965) citado por Streubert e Carpenter1, expôs que o método fenomenológico procura fenómenos subjectivos com base na experiência vivida. Também Apostolo et al. (2004) conta-nos que a fenomenologia pode-se representar-se como um modo de tornar a filosofia numa ciência de rigor, sendo uma ciência descritiva, procura descrever não se preocupando em encontrar relações causais, e sim mostrar a essência do fenómeno.
Foram ainda definidos dois objectivos específicos:
Constituem-se como potenciais participantes deste estudo, os licenciados em enfermagem que prestam cuidados no âmbito da saúde do adulto, há mais de cinco anos, na Unidade de Saúde Familiar de Marmelais. Os critérios estabelecidos para a inclusão dos enfermeiros neste estudo, alicerça-se no entendimento de que a formação, ao nível da licenciatura, por parte dos enfermeiros determina o seu entendimento profissional e a sua prática de cuidados, por outro o estudo da percepção destes enfermeiros face ao adulto com doença mental, determina claramente que estes enfermeiros mantenham contacto com adultos com doença mental. Foi ainda definido que estes enfermeiros deveriam ter mais de cinco anos de experiência profissional ao nível dos cuidados de saúde primários, no sentido de assegurar uma experiência profissional relevante por parte destes enfermeiros. A forma de seleccionar esses participantes baseia-se no conhecimento específico que eles têm de um determinado fenómeno, com a finalidade de partilhar esse conhecimento, constituindo assim uma amostra intencional. Gauthier et al2 referem que a selecção intencional “ (…) tem por objectivo alcançar os depoimentos mais ricos e diversificados (…) em que (…) o critério numérico (…) se torna uma preocupação menor porque o que nos interessa, isto sim, é a qualidade do informante e não precisamente a quantidade (…)”. Pelo facto de nem todos os enfermeiros, que fazem parte desta unidade de saúde, serem licenciados, e desenvolverem cuidados assentes no paradigma da enfermagem familiar, os participantes deste estudo ficaram limitados ao número de três. Após o convite realizado pelo investigador, no que diz respeito à participação dos enfermeiros nesta investigação, a mesma foi aceite pelos três enfermeiros. Com a escolha dos participantes não pretendemos ter uma representatividade da população geral, e sim, percepcionar e explorar as percepções especificamente destes enfermeiros face ao adulto com doença mental. Ao longo da apresentação deste trabalho iremo-nos referir aos enfermeiros usando nomes fictícios, tal como: Ana (E1), a que corresponderá a entrevista número um, João (E2) a que corresponderá a entrevista numero dois, e a Maria (E3), a que corresponderá a entrevista numero três. O instrumento mais frequentemente utilizado para a colheita de informação de acordo com Moreira3, é a entrevista e como refere Streubert e Carpenter1 a entrevista é uma óptima fonte porque permite entrar no mundo da outra pessoa, optámos por recorrer à entrevista semi-estruturada. Polit et al (2004) referem-nos que, nas escolas de fenomenologia desenvolveram-se várias abordagens para a análise dos dados, existindo na enfermagem três métodos de análise de dados que são usados frequentemente, a escolha do processo interpretativo que consideramos adequar-se a esta investigação, é o de Colaizzi. Visando assegurar a confidencialidade e o anonimato das informações serão por conseguinte respeitados os aspectos éticos que Erickson citado por Lessard-Hebert et al (1990). ResultadosIntervenção entre o primeiro e o segundo momento: Plano de cuidados para intervenção em registo SAPE com linguagem CIPE- Consulta de Enfermagem.
Formação Equipa de enfermagem
Os planos de cuidados de enfermagem entregues e monitorizados na pratica dos profissionais, foram também complementos do dossier de praticas do local de exercício de investigação. Assim na primeira intervenção, os planos de cuidados facultados em formato de papel aos profissionais faziam parte da sua intervenção para registo em programa SAPE com linguagem CIPE, favorecendo a monitorização de acções de enfermagem na área de saúde mental. Análise Interpretativa: Nervosismo: Após intervenção, expressam sentimentos nessas mesmas vivencias de, confortável, atenção e satisfação. Esta mudança, com certeza muito derivada a intervenção acção realizadas, nesta mudança de sentimentos vivenciados na prestação laboral. Ausência de Mensuração das Actividades: " (…) o sistema não está preparado para isso, e possivelmente nós também teríamos dificuldades em faze-lo sem formação específica, mas o SAPE não contempla um programa de saúde mental, só ai se vê a importância que é dada a este tipo de intervenções.” (João). Ausência de Consulta Especifica: Observamos num segundo momento a manutenção das mesmas unidades de significação com a expressão de significado diferente, reportando-se a uma profundidade e entendimento de necessidades do doente com um conhecimento e abordagem diferente. Doente com Necessidades Especificas: No que diz respeito às limitações atribuídas pelos enfermeiros de cuidados de saúde primários ao doente mental, no primeiro enfoque o estado do fenómeno revela necessidade gerais na satisfação de necessidades humanas básicas, contudo nessa compreensão leva-nos a crer um certo estigma associado à patologia mental, de dependência e invalidez nas actividades de vida diárias e no modo de as resolver, após um segundo momento interventivo, observa-se um mudança de compreensão descrevendo essas limitações na unidade de significação ausência de limitações, compreendemos que nesta expressão não se resume à identificação de limitações de um doente com patologia e sim á caracterização não discriminativa de uma patologia especifica que por si só poderá oferecer limitações e que mesmo assim não pode ser considerada como característica personalizante da própria patologia. Constatamos mais numa vez a mudança paradigmática da concepção da compreensão das vivencias dos enfermeiros face ao adulto com patologia mental. Quanto às qualidades atribuídas pelos enfermeiros de cuidados de saúde primários ao doente mental constatamos as descrições de afectividade/ sensibilidade, confiança nos outros, e nenhumas em específico, num segundo momento notamos as referências mantidas nas unidades de afectividade/ sensibilidade e de nenhumas em específico, também aqui se observa a manutenção das unidades de significação, contudo pelos descritos observa-se neste segundo momento uma compreensão de significado atribuído diferente do adulto com patologia mental, e que neste segundo momento as verbalizações apresentam maior profundidade de descrição das qualidades bem como a ausência de estigmatização dirigida. Na descrição do doente Mental numa só palavra, a mesma é descrita por humano e infeliz, e num segundo momento a manutenção de humano e doente. Mais uma vez constata-se a mudança, agora ligeira, da descrição de doente mental em uma só palavra, contudo e como antes referido denota-se mais uma vez uma compreensão da expressão utilizada mais dirigida e caracterizante de um doente mental, sem juízos de valor ou atribuições de significações pré concebidas. ConclusiónUma ciência em construção, com fundamentação científica adequada requer monitorização e avaliação contínua da prática exercida de quem a desempenha, são os enfermeiros os responsáveis pela manutenção e exercício desta prática, cabe a estes executa-la a fazer desta ciência uma construção contínua adquirindo um crescimento de cuidados por excelência. Com esta investigação procuramos dar essa visão e procurar contribuir para essa mesma evolução, adequando práticas regulares do exercício actual de enfermagem, para uma adaptação contínua ao principal objectivo que fundamenta a criação desta ciência. Procurando dar resposta a necessidades teorizadas, procuramos desenvolver estudos que demonstrem necessidades para um processo de crescimento contínuo no domínio da enfermagem de saúde mental e psiquiatria. Algumas dificuldades sentidas na elaboração desta investigação estiveram presentes, pois poucos estudos científicos se reportam às ópticas dos cuidadores, e das necessidades que estes identificam como lacunas ao exercício do cuidar em enfermagem no domínio da saúde mental e psiquiatria. É importante ainda referir que temos consciência, de que num contacto tão próximo e directo com a equipa de enfermagem alvo do estudo de investigação, pode ter produzido por si só alteração do fenómeno, pois os elementos conheciam a nossa intenção de avaliar, intervir e novamente reconhecer o estado da diferença inicial, e com tantas horas de formação e intervenção, os próprios profissionais poderiam expressar termos que fossem em direcção às esperadas pelos investigadores, contudo temos de referir que se o mesmo se deu, era pouco notável, pois as expressões utilizadas e formas de discurso revelavam construções internas já enraizadas e não expressadas apenas por vontade ou intenção do investigador. Esta investigação, pode assim, ser considerado como um passo para uma necessidade emergente das vivencias dos enfermeiros nos cuidados de saúde mental, e a justificação para um exercício especializado nesta área de cuidados de saúde, reconhecida pelos enfermeiros neste espaço de investigação. Referencias
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ISSN 0717-6384 |